terça-feira, 5 de outubro de 2010

Pequena Prece

No coração da solidão é onde nascem os lobos
com fendas nos olhos e capas de sombra
suspensos no tempo diante da Lua, como uma nuvem
perdida que o vento navega - mas são só brinquedos os barcos
de madeira velha... Pelo riacho tecido de cetim azul
a brincadeira é sem fim para o menino crescido
Dos caracóis do mar - desenrolados - cachoeiras de cachos
espalhando na praia, vê o brilho! É a garrafa de vidro
com os desejos selados, o mais sincero dos beijos e a confissão
sagrada! Só o vento esfriando o corpo, andar contra o Sol
é como ver através do fogo, tudo é pura chama e o coração dêgelo
e os cristais partindo enquanto os sinos quebram
Quando o cravo chora - fica o palhaço sorrindo com seu nariz de aurora!
O tapete é de folhas secas, o deserto vai na boca
qualquer palavra é rouca, todo consolo é pouco - mais uma folha
desprende, amarelada e ausente, dança no ar feito louca
e deita solenemente! O vagabundo pode caminhar
arrastando sóis poentes com sua capa, pode cantar a melodia
ousada dos que varam o tempo sem fugir de nada
mas vai levar no peito, mesmo sem notar, um bonito colar
mais pesado que a terra, mais intenso que o mar...
Os filhos da tisteza - nessa roda estranha
que hora nos dá tudo e depois vem tirar...
O suspirar do mundo, do mundo grande mundo que não para
de rodar! Ajoelharam-se as árvores e recolheram-se as nuvens
da tempestade incontida... Nas ruas da velha vila
onde nada nunca se move, um relâmpago inflamou...
Agora choro, agora chove! E essa vontade de ser anjo
querendo falar com Deus, esse desejo de poeta
querendo ver a flor desfeita regredindo ao botão
numa implosão de pétalas! De apanhar nas mãos essa rosa
entreaberta! Mas não, diz a ciranda, agora as meninas
que se dão as mãos levando na face um olhar de sua mãe...
Feitas tão só de inocência e de amor e de infância
vão notar o silêncio, como dói teu silêncio, minha pequena esperança!
A palavra é a pétala que não posso ofertar, enquanto
essa pérola cresce nos meus olhos e desce
como uma estrela que vai ao mar e lá descansa
dorme pra sempre! Brilha serena no meu poente, a bela ausente
que é uma promessa, do azul bonito, do reencontro,
da primavera depois do inverno, do mais que eterno
amor que temos e de nos vermos no infinito!

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